segunda-feira, 9 de março de 2009

Watchmen, entre o vazio e o falso

Li pela primeira vez Watchmen em 1998 quando foram comemorados os 10 anos do primeiro lançamento da série no Brasil. Ainda hoje esperamos por uma obra tão poderosa quanto ela no mundo dos quadrinhos, então posso dizer que havia alguma expectativa para com a adaptação para o cinema que estreou na última sexta-feira, dia 6. Entretanto a vontade maior era saber quais escolhas havia feito o diretor e como ele encaixaria certos aspectos tão impossíveis no cinema (como alguém mostraria a história do pirata intercalado durante todo o filme?). De todo modo expectativa foi algo que aprendi a não alimentar.

Dito isso posso chegar ao filme e dizer que tudo em Watchmen parece falso.

A começar pelos atores. Malin Akerman como Lourie(Espectral) é tão fake que chega a ser risível. “A belíssima Malin Akerman, peca pela falta de expressividade, reagindo com absoluta indiferença a qualquer coisa que surja à sua frente”, disse Marcos Vilaça do Cinema em Cena. Mas o pior ainda está por vir, Matthew Goode, ator que faz Adrian Veidt, consegue a façanha de soar 10 vezes mais falso ainda. Goode é de uma inexpressividade medonha, coisa que toca o absurdo. Ridícula a cena em que ele diz que se obriga a sentir cada uma das mortes que provocou com suas ações. Não se vê, percebe ou sente sentimento algum. Sobre os outros atores, Jeffrey Dean Morgan dá uma caldo como Comediante, já o resto é raspa de coco e nem merece citação.

Ao passarmos para o quesito adaptação, o filme claramente tenta ser o mais fiel possível ao quadrinho, tarefa que dá conta já que grande parte das falas são transpostas de um para o outro. Até muitos enquadramentos são os mesmos. Não via algo assim desde Sin City.

Ao decorrer da obra, percebemos um filme quase pomposo, que abusa do uso do áudio soando por muitas vezes retrô e, como já disse, fake. A demasia é tamanha que a música não te permite pensar nem por um minuto sequer, já que ela te entrega todas as emoções que eles desejam transmitir. “Imbecis”, dizem eles com a trilha sonora.

Outra questão são os efeitos especiais. Há mais de uma década não permitimos que esse tipo de recurso pareça não menos do que perfeito. Em Watchmen não é. Dr Manhattan é falso (alguém me dá um sinônimo), assim como sua cor, movimentos, falas e gestos. O castelo em movimento criado por Manhattan em Marte não me parece verdadeiro, assim como uma certa explosão e ainda muitos do movimentos de luta são forçados. Me perguntei se o diretor queria se exibir com certos efeitos. Parecia mera firula.

O filme começa bem com uma seqüência narrando a aurora e crespúsculo da saga justiceira. Mas o que parece até um início promissor é desfeito antes da metade do filme, até esse momento me enganei repetindo-me que aquela seria uma grande obra. A ignorância é audaciosa (já dizia Mão Santa) mas a razão não tarda a voltar. A partir daí tudo ficou enfadonho.

Entendo que se trata de um filme e não da gravação do quadrinho (aprendi com Senhor dos Anéis) e assim tentei assisti-lo, mas existiram escolhas por demais equivocadas. Exemplos são a morte de um assassino pelas mãos de Rorschach e a exibição mais do que desnecessária de uma cena de sexo em uma nave. Todos duas cenas não acrescetam absolutamente nada a trama, no caso de Rorschach até distorçe um pouco a persona. Não tenho problema com violência ou sexo na tela, mas peças fora do lugar sempre saltam aos olhos.

Como já dito a direção de atores é péssima. Com exceção de Jackie Earle Haley que faz Rorschach, todos os outros não me passaram segurança alguma. Pareciam caricaturas de alguém ou simplesmente atores fingindo demonstrar o que não são capazes.

O único momento que me senti tocado foi com a discussão entre Rorschach e Dr. Manhattan já no fim do filme. Finalmente me identifiquei de alguma forma com aqueles personagens, perto do fim eles demonstraram alguma humanidade, mas aí já era tarde demais para salvar Watchmen.

Uma das poucas sacadas interessantes de quase três horas de filme foi ter colocado um nariz enorme no ator que representa o presidente Nixon. Coisa que o fez parecer com Pinóquio, aquele boneco que tinha seu nariz aumentado toda vez que mentia.

O fato é que na sua tentativa de ser no cinema tudo o que o Graphic Novel representa nos quadrinhos, o diretor acaba nos presenteando com uma obra quase vazia. Cheia de sons e imagens de pretenso impacto sem muito sentido. Para terminar, em meio a minha histórica discordância com a crítica Isabela Boscov, da Veja, sublinho ponto a ponto o último parágrafo do texto que escreveu sobre Watchmen. Diz ela:

“Zack Snyder segue de muito perto tanto as situações descritas por Moore como essa tristeza dos protagonistas. O que ele não consegue é exprimi-la: no seu empenho em traduzir o quadrinho em imagens que só poderiam existir no cinema e em nenhum outro meio visual, Snyder cerca esse centro emotivo da história com tanto som e fúria que o obscurece por completo. Assim, mesmo atores fortes como Patrick Wilson(coruja) e Billy Crudup(Dr. Manhattan) ficam pequenos e fora de escala nesse tableau gigantesco; e, quando a violência irrompe, ela não transmite ferocidade – parece apenas gratuita e quase pornográfica, uma espécie de tranco com que tirar a platéia da apatia induzida pelo excesso de enredo e falta do que comunicar com ele. Watchmen parece, portanto, destinado a se tornar um marco: um marco tanto na sua estupenda concepção visual e de linguagem, como da esterilidade para a qual uma certa vertente do cinema americano vai caminhando. Como o Dr. Manhattan, este é um filme imensamente poderoso e impressionante – e que mal consegue se lembrar do que é ser humano”.

Como disse o Comediante, tudo não passa de uma piada.

3 Comments:

Anônimo said...

Entrei aqui por acaso e não pude não ler...
De fato a trilha sonora estrangula a liberdade de sentir o filme, mas não deixa de ser ótima. Entretanto a frieza das personagens casa bem com o clima de desilusão oitentista: não só pela década altamente depressiva, mas também pela situação do cenário mundial na história. Creio que a falta de expressividade nas atuações só alimenta a desilusão para com a natureza humana, são pessoas que olham de cima, e esquecem como é ser humano. E, convenhamos, não dá para adaptar uma revista na íntegra, ficaria um bombardeio gigantesco! Para uma adaptação esse filme está bom! E para quem não leu a revista, ele está ótimo!

Pedro Santiago said...

Olá Beatriz, obrigado pela visita, leitura e comentário. Vc é muito bem vinda.

Sobre o filme ficou perceptível que temos uma visão diferente, o que vc chama de frieza, a mim soa inexpressividade e incompetência dos atores. Vc olhou e viu aquilo(a falta de expressão) como artifício, para mim estampou exatamente a falta dele. Um exemplo de inexpressividade usada de forma primorosa é a atuação de Javier Barden em Onde os Fracos Não Tem Vez.

"Entendo que se trata de um filme e não da gravação do quadrinho", disse no texto. É fato que não posso fingir que nunca li a série assim como é fato que nunca pedi uma adaptação literal( como disse aprendi com senhor dos anéis), apenas questionei algumas escolhas as quais achei sem sentido. Essa sempre foi a minha questão, saber quais escolhas eles fariam.
Uma coisa concordo com vc, acho que tirando as interpretações sofríveis e a trilha sonora perdulária, para quem não leu a série o filme deve soar até bom. Mas para quem leu......

Por fim queria dizer que uma adaptação pode ser um filme tão bom quanto qualquer outro. Falo isso pela sua frase: "Para uma adaptação esse filme está bom!"
Aliás existe um ditado no cinema dando conta que livros ruins dão bons filmes, mas isso é besteira. Qualquer assunto pode vir a se tornar um grande filme. Em se falando de adaptação, pouco podemos questionar das qualidades de filmes como O Iluminado e Barry LIndon(Kubrick), Cavaleiro da Trevas, Além da Linha Vermelha e tantos outros; assim como podemos malhar sem dó em Código Da vinci, TRóia, O Guarani, Olga, Demolidor e milhares de outros.

Mais uma vez agradeço sua visita e comentário. Volte sempre, discussão é melhor do monólogo. ABraço

Unknown said...

menino, vc gosto do filme menos do que eu. eu tinha pensado que era o contrário.

mas o filme sofreu do mal do diretor errado.

escrevi alguma coisa lá no meu blog antes de ler aqui.

concordo contigo sobre o filme, só que sem a parte do ódio.

acho que a trilha sonora funciona bem na morte do comendiante.

e vc, as citações do Kubrick no filme (Dr. Fantástico e 2001)?